Entre o espaço e o tempo surge uma linguagem que não se vê e que é o sentido primário da comunicação. Essa não verbalização que pontua o dia-a-dia, sem que nos apercebamos, é a razão pela qual esta publicação se debruça sobre o tema da proxémia – neologismo criado pelo autor e que aborda o estudo das distâncias ocultas entre pessoas e o espaço.
O livro “A Dimensão Oculta”, datado de 1966, da autoria do antropólogo Norte-Americano Edward T. Hall, revela uma análise profunda acerca destas preocupações – O espaço e como o ser humano o percepciona e se apropria dele.
Com base nessas interacções, invisíveis por um lado, mas sensoriais por outro, Hall tece e aprofunda um conjunto de considerações que permitem ao leitor perceber as razões por detrás do não palpável. Já no seu primeiro livro “A Linguagem Silenciosa”, de 1959, faz uma primeira incursão sobre o tema do não visível, analisando as relações de uma linguagem de comportamento que não faz recurso à palavra.
Voltando ao título em ênfase, é notável como o autor compreende diferentes contextos de análise e comparação, como é evidente nos casos de comparação da proxémia entre as culturas alemã, inglesa, francesa e entre as culturas japonesa e árabe. Distintas realidades culturais originam relações díspares.
É neste âmbito que ele perspectiva e desconstrói um conjunto de cenários de acordo com realidades culturais que originam reacções particulares entre as pessoas e estas e o espaço, categorizando determinadas dimensões ocultas que, apesar de não serem consciencializadas, acontecem. São exemplo disso as quatro distâncias possíveis, segundo Hall, na partilha do espaço: íntima, pessoal, social e pública. Cada uma delas caracterizada mediante dimensões específicas.
Faz, ainda, referência à importância que os 5 sentidos têm na percepção do “território” que nos rodeia e como nos relacionamos com essa realidade através de diferentes estímulos sensoriais, porque todos nós possuímos, na nossa mente, uma representação do mundo através de imagens, sons e sensações cinestésicas. Esse mesmo “território é, em todos os sentidos da palavra, um prolongamento do organismo, marcado por sinais visuais, verbais e olfactivos”. A percepção do espaço divide-se em duas categorias de receptores: “os receptores à distância” – olhos, ouvidos e nariz e “os receptores imediatos” – tacto, sensações na pele, mucosas e músculos.
A dimensão oculta, por si só, é o espaço que nos aproxima, que nos distancia e que torna possíveis os nossos afectos e relações humanas sem que uma determinada consciência revele essas evidências. Está, intimamente, ligada à Arquitectura e ao planeamento das cidades.
Em suma, Edward T. Hall apresenta-nos, em catorze capítulos, um conjunto de evidências que sustentam todo este estudo acerca da dimensão oculta, cultura e comunicação, contribuindo para um raciocínio interpretativo acerca das reacções e atitudes que tomamos, no quotidiano, perante o espaço que nos circunda. Ajuda-nos a compreender que a dimensão cultural de um determinado povo é um factor determinante para entendermos as diferenças dos seus comportamentos.
Passado, quase, meio século desde a primeira edição deste livro, todos os pressupostos aqui anunciados revelam-se extremamente actuais e úteis para disciplinas como a Sociologia, Arquitectura, Urbanismo, Antropologia do Espaço, entre outras. Apesar da inegável importância e impacto da obra, não deixa de ser surpreendente o facto de não ter havido, nos últimos cinquenta anos, uma maior relação entre a teoria e a prática, pelo que, numa era de arquitetura global, é interessante revisitar este autor.
HALL, Edward T. – A Dimensão Oculta. Lisboa: Relógio D’Água, 1986.
HALL, Edward T. – A linguagem Silenciosa. Lisboa: Relógio D’Água, 1994.
Márcio de Campos, arquitecto. 2014