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Manuel Lacerda

Recensão crítica do livro The architecture of additions – design and regulation

Creative Commons, licence CC BY-4.0: https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/

Apesar de ser uma das práticas de projeto mais frequentes, o tema das adições sobre pré-existências arquitetónicas e urbanas não tem sido objeto de muitas reflexões focalizadas e sistematizadas sobre o assunto; muitos projetos que se enquadram nesta tipologia aparecem-nos em obras monográficas de autor, normalmente dispersas. Assim, esta publicação com a sua primeira edição em 1998, apresenta um especial interesse, problematizando e sintetizando em 191 páginas algumas das questões fundamentais que se colocam aos arquitetos e aos responsáveis pela gestão do património arquitetónico e urbano no ato de projetar e decidir; mantém uma atualidade surpreendente e revela-se de grande utilidade prática pela variedade de casos apresentados e pela profundidade da sua análise. De que forma um edifício pode afetar o significado de outro quando as suas diferentes expressões se combinam e interagem? E como é que se afetam mutuamente quando um deles está protegido do ponto de vista do interesse público patrimonial? Estas duas questões estão presentes ao longo de todo o livro, propondo uma estrutura de pensamento que nos ajude a dar-lhes resposta.

Iniciando com uma reflexão atenta sobre o valor público (ou melhor, os valores públicos) da arquitetura – questão que está hoje na ordem do dia – o autor estabelece as relações entre a obra arquitetónica e a construção da identidade dos lugares e das pessoas, a dinâmica da reconstrução de identidades, os sucessivos e múltiplos impactos das intervenções sobre intervenções – criando continuamente novos significados – e os valores gerados nessas interações. A questão da evolução do significado da obra de arquitetura que é objeto de uma adição, de uma ampliação ou, em termos mais gerais,  de uma modificação, é trabalhada pelo autor em 4 capítulos, centrando metodicamente a sua análise sempre a partir de casos de estudo paradigmáticos – fundamentalmente europeus e norte-americanos – e com um vasto apoio gráfico. O Capítulo 1 “A evolução do significado (da arquitetura) em obras combinadas – as lições dos Mestres” analisa, através de diferentes casos, situados cronologicamente num arco que abrange desde as sucessivas adições na Igreja de S. Pedro, em Roma, até às intervenções em Castelvecchio, em Verona, o papel da arquitetura pré-existente em confronto com a arquitetura adicionada, nas suas qualidades de antigo e de novo (moderno), e a forma como elas realçam reciprocamente os respetivos valores.

No Capítulo 2 “Obras combinadas do século XX: as possibilidades (potencialidades) expressivas do Modernismo”, o autor, partindo simbolicamente do caso da Torre Eiffel no seu contexto urbano em Paris, como marco simbólico de partida da proliferação das potencialidades expressivas que aceleraram no seculo XX com o movimento moderno, apresenta um conjunto alargado de casos que ilustram os impactos das intervenções do modernismo em edifícios pré-existentes e o contributo recíproco para uma melhor compreensão dos respetivos significados; o autor organiza os casos apresentados em 3 categorias: i. (adições) em extensão, ii. (adições) por derivação e iii. (adições) por transformação, apresentando projetos tão distintos com o Reishstag, em Berlim, a Ópera de Lyon, o Centro Pompidou, a Maison Carré e a Ópera em Nimes, o 500 Park Avenue em Nova Iorque (edifício da Pepsi-Cola), o Falkestrasse 6 em Viena, ou o Palácio da Justiça de Göteborg, na Suécia. No capítulo 3 “Obras combinadas do século XX e a Legislação: o caso especial da salvaguarda” temos a possibilidade de ver explanado de uma forma muito clara, e mais uma vez apoiado em casos concretos e categorizados, como as disposições legais em matéria de salvaguarda do património arquitetónico e urbano acompanham, condicionam e integram a prática do projeto sobre a pré-existência, neste caso praticamente todos norte-americanos e ingleses, incluindo exemplos como o Museu Guggenheim ou o Museu Whitney, em Nova Iorque. Por último, no Capítulo 4 “Obras combinadas e expressão contemporânea: a arquitetura de adições no final do século XX”, Paul Byard faz uma arrojada classificação tipológica onde é mais evidente o conflito entre a compreensão de uma pré-existência como fonte de informação e inspiração para um novo projeto de adição, e a emergência de novos padrões de intervenção resultado já de uma mundialização de imagens, informações e intercâmbios a nível do planeta, que configuram uma grande diversidade de abordagens: i. a arquitetura da imitação, ii. a arquitetura das formas das coisas, iii. a arquitetura da apropriação e iv. a arquitetura da possibilidade.

The Architecture of additions – design and regulation, apesar da sua 1ª edição datar de 1998, revela-se hoje uma obra de grande atualidade, em especial num período de crise global, de falência de valores e ideologias, de abertura a novos entendimentos do mundo e dos processos criativos, problematizando de uma forma clara os pressupostos e o impacto das intervenções em contextos patrimoniais nas sociedades e nas pessoas.

 

BYARD, Paul Spencer. The architecture of additions – Design and regulation. W.W. Norton & Company, New York, 1998, ISBN 0-393-73021-2