PDF Repositório UAL – Não disponível

Maria Manuela Mendes

(CIAUD, Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa e CIES- Centro de Investigação e Estudos em Sociologia – ISCTE/IUL)
mamendesster@gmail.com

 

Beatriz Padilla

(Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho, Centro de Investigação em Ciências Sociais, CICS-UMinho)
padilla.beatriz@gmail.com

Creative Commons, licença CC BY-4.0: https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/

Resumo

Partindo de um roteiro de pesquisa de pendor qualitativo, procura-se neste texto dar a conhecer alguns dos resultados exploratórios de uma pesquisa de caráter mais amplo levada a efeito no bairro da Mouraria em Lisboa entre 2009 e 2011. Neste contexto e com base nos discursos dos atores sócio institucionais que intervêm neste território procurou-se desvendar os contornos das perceções construídas em torno das transformações sócio-espaciais mais recentes que têm marcado este bairro lisboeta. Das evidência empíricas, sobressaem imagens, paradoxais e dialógicas que indiciam uma trama reticular que intersecta atributos como o de bairro histórico e típico, espaço multicultural e cosmopolita, mas também território difamado e relegado.
A convergência de um conjunto de condicionantes político-institucionais e que são aqui tematizadas têm ajudado a reforçar a imagem de bairro em transição e transformação, progressivamente cosmopolita e multicultural, fazendo parte integrante de vários roteiros turísticos e de consumos, afigurando-se cada vez mais como um lugar atrativo tanto para estrangeiros e turistas, como para trabalhadores e residentes.

 

BAIRRO DA MOURARIA EM LISBOA: TERRITÓRIO DE CONVIVÊNCIA CULTURAL E DE DIVERSIDADE

 

1. Nota prévia sobre o contexto teórico e empírico

Este texto tem por base uma pesquisa mais ampla realizada no Bairro da Mouraria em Lisboa[1] e cuja temática central se desenvolve em torno das culturas de convivência e da super diversidade, assentando a sua matriz concetual nas propostas teóricas desenvolvidas por P. Gilroy e S. Vertovec.
A análise efetuada a este bairro lisboeta assenta em dois conceitos-chave, o de conviviality de Paul Gilroy (2004) por nós traduzido por culturas de convivência e o de superdiversity de Steven Vertovec (2004, 2007a, 2007b) ou super diversidade.O primeiro conceito procura dar conta dos processos de coabitação e de interação que fazem com que o multiculturalismo seja uma característica comum e banal da vida social dos centros urbanos, nomeadamente em cidades pós-coloniais marcadas pelas “novas migrações”. No locus de estudo, intentamos operacionalizar este conceito a uma escala micro local, mais concretamente à do bairro.

Vertovec por seu turno contribuiu de forma indelével para o debate crítico em torno do multiculturalismo, ao propor o conceito de super diversidade que procura superar as limitações associadas à utilização da etnicidade como principal fator explicativo da diversidade. Embora o multiculturalismo surja por vezes como um equivalente da diversidade, o termo super diversidade invoca a importância das “novas combinações e interações de variáveis” presentes nas sociedades contemporâneas. No entanto, as variáveis da super diversidade não são completamente novas, nem tão pouco muitas das suas correlações. Esta proposta conceptual implica a adoção deuma abordagem multidimensional, que inclui a interseção de variáveis como o país de origem, a etnicidade, as línguas, a religião; os canais de migração e o estatuto jurídico; a inserção num dado local; as práticas transnacionais e as respostas geralmente proporcionadas pelas autoridades locais, prestadores de serviços e moradores locais.

No contexto da presente investigação, a operacionalização destes conceitos remete-nos diretamente para odesign da pesquisa empírica de pendor dominantemente qualitativa [2], sendo que um dos principais objetivos consistiu em identificar, descrever e analisar contextos de super diversidade e de convivência cultural em espaços onde as migrações e a diversidade fazem parte da vida quotidiana. Os procedimentos metodológicos adotados procuraram ainda descortinar junto de residentes, empresários, trabalhadores e agentes socioinstitucionais com intervenção próxima e quotidiana nos contextos selecionados, as perceções construídas em torno da Mouraria enquanto contexto de super diversidade, assim como, os modos de convivência dominantes, sem esquecer as tensões e conflitualidades latentes e manifestas neste locus.

 

2. Lisboa e bairro da Mouraria: a cidade entre as (Diver) cidades

Os resultados que aqui se apresentam têm como referencial empírico o Bairro da Mouraria, que juntamente com outros bairros (Bica, Alfama, Castelo, entre outros) pertence ao grupo dos Bairros Históricos e Conjuntos Urbanos que imprimem uma identidade particular a Lisboa, sendo-lhe atribuído um posicionamento singular no contexto desta cidade. Este bairro é evocado em alguns documentos produzidos recentemente por organismos e serviços estatais como sendo uma “marca”, assumindo o “espírito do lugar”, o que torna este bairro e a cidade de Lisboa como competitiva ao nível das redes de cidades interculturais do mundo, no mercado do turismo e do turismo de cidades em particular (UP Mouraria, 2010: 3), fazendo parte hoje em dia da agenda cultural da cidade de Lisboa. Aliás s Revista Time Out de 18 julho de 2013, que é uma a publicação semanal consagrada à promoção e divulgação de eventos culturais em Lisboa, Mouraria, dedica uma parte da edição à Mouraria sob o título enigmático “Tudo sobre o bairro mais surpreendente de Lisboa”. Para Sharon Zukin (1995), há uma correlação entre as migrações e a economia urbana em ordem à criação de uma economia etno cultural que pode mudar a feição da economia urbana, por via da criação de novos mercados, novos produtos e serviços, novas dinâmicas culturais entre outros aspetos. Neste contexto, em cidades como Miami (em que cerca de metade da sua população nasceu no exterior), Amesterdão e Londres é possível encontrar uma dinâmica de hiper diversidade. A este respeito, Richard Florida (2004) sublinha a importância da diversidade como fator de diferenciação e atratividade para as classes criativas, concluindo que as cidades mais procuradas são aquelas em que existe maior diversidade étnica e cultural. Com efeito, para Florida (2004) as migrações conferem um caráter cosmopolita às cidades, tornando-as mais procuradas por essas classes.

As suas origens no fundo dos tempos como arrabalde árabe ou “Mouro” fazem parte da história da própria cidade de Lisboa, enquanto a “diversidade cultural” associada à presença mais recente de imigrantes neste local é encarada como um fator chave de competitividade entre cidades.Num sentido mais amplo, a Lisboa da diversidade faz sobressair amultiplicidade de origens, tanto de pessoas como de produtos e/ou serviços culturais, em presença na cidade (Carvalho, 2006: 92) e mais concretamente o Centro Comercial da Mouraria “representa um centro de atividade cosmopolita sem paralelo” (Agenda CML, Abr. 2004: 6), constituindo “um mercado animado e um melting pot multiétnico” (Time Out, 2001: 166, cit. in Carvalho, 2006: 93). Em 2009, foi elaborada uma candidatura ao Quadro de Referência Estratégica Nacional (QREN), o “Programa de Ação: as cidades dentro da cidade”, sendo que atributos como a multiculturalidade e a diversidade étnica no bairro têm sido bastante reforçados e ampliados pelo “Festival Todos” e pelas iniciativas da associação “Renovar a Mouraria” através de passeios temáticos, como o “Venha Conhecer a Mouraria Chinesa” ou “Mouraria: da sua origem à atualidade multicultural e bairrista: 900 anos de história”.

A partir da análise documental efetuada, evidencia-se o apelo ao cosmopolitismo e ao multiculturalismo que coexiste e até se concilia com a imagem de Lisboa enquanto cidade de bairros – populares, pitorescos e típicos – persistentemente produzida ao longo deste século (Cordeiro e Costa, 1999: 58).

Esta diversidade étnico-cultural nas cidades tem segundo Sharon Zukin (1995) impactos significativos e positivos. No entanto, a diversidade também pode ser encarada como uma ameaça à coesão social e territorial em algumas zonas de cidade compostas por uma coexistência multiétnica, mas ao invés, este atributo pode também ser capitalizado em campanhas de marketing urbano, associadas a estilos de vida cosmopolitas, apelando ao consumo de produtos e serviços alternativos e dotados de uma certa autenticidade.

Ainda que o bairro seja uma noção polissémica, fluída e difusa, afigurando-se ora como um conjunto, ora como parte de algo compartilhado, ou ainda como uma parte de uma cidade com uma fisionomia própria e dotada de uma certa unidade, configurando-se assim como uma singularidade (Clavel, 2004: 73); pode, ainda, ser considerado como uma noção ideológica (Lefebvre, 1967 cit. in Clavel, 2003: 74-75), representando um ideal de vida comunitária enquanto quadro natural da vida social à escala humana. O bairro é uma unidade sociológica relativa, subordinada, que não define a realidade social, mas que é necessária. “Sem bairros, assim como sem ruas, poderá haver uma aglomeração, um tecido urbano, uma metrópole, mas não há cidade” (Lefebvre, 1971). É neste contexto que o espaço e o tempo dos habitantes tomam forma e sentido no espaço urbano (Lefebvre, 1971). Cordeiro e Costa (1999: 60) acrescentam que os bairros “são lugares reais e imaginados, intrinsecamente articulados com outras unidades sociais: desde os pequenos nós de interação vicinal, informais, por vezes estruturados em redes discretas, ou polarizados em torno de uma rua, de uma associação ou de uma loja; passando pela freguesia, unidade política e administrativa mais ampla”.

Os discursos dos atores sócio institucionais com intervenção no bairro surgem eivados de algumas contradições, tensões e conflitualidades, tendendo a organizar-se em torno de dois eixos de análise: as transformações sociais e urbanísticas recentes e os modos de convivencia entre residentes, visitantes e comerciantes de origem imigrante e autóctone.

 

3. Sobre os modos de convivência

Neste lugar coexiste uma certa diversidade de estatutos e de práticas entre usuários, trabalhadores e residentes, sejam moradores antigos, autóctones ou sejam novos moradores, migrantes e imigrantes. Marluci Menezes (2003), no estudo que efetuou sobre o bairro da Mouraria, entre 1997 e 2001, salienta a presença de duas redes de sociabilidade e de vizinhança local: a rede de vizinhança por residência e a de vizinhança por trabalho. Na atualidade, esta distinção assume ainda alguma pertinência, no entanto é possível ainda acrescentar uma terceira opção que denominamos rede de vizinhança por consumos, marcada pela socialização à volta de certos consumos e estilos de vida, de certa forma mais alternativos, que acontecem no bairro, especialmente com a abertura de novos cafés, restaurantes e espaços de lazer.

Mais recentemente, num estudo realizado por Paula Gésero (2011) no bairro da Mouraria e Praça do Martim Moniz foi possível constatar a existência de tensões entre os residentes e comerciantes autóctones e residentes e comerciantes de origem estrangeira. Os autóctones entrevistados pela autora chegam a usar uma linguagem inflamada para descrever o desrespeito face aos horários de recolha do lixo por parte dos residentes imigrantes, bem como, os seus comportamentos não higienistas (atiram lixo pela janela, a sujidade, pautando-se pela falta de limpeza no interior dos edifícios e das suas habitações).

Numa das observações de terreno realizadas no contexto do projeto que aqui apresentamos, um dos comerciantes revelou que “não está contente com a chegada de imigrantes”, referindo que são” Tantos que já é um exagero”, acrescenta ainda que os indianos, paquistaneses, bangladeshis colocam durante o dia os inúmeros sacos de lixo à porta, apelidando-os de “porcos”.

A má fama do bairro e de outras áreas contíguas, como a Praça do Intendente é também associada à presença de comerciantes e clientes de origem imigrante.Um dos entrevistados também comerciante mas autóctone realça que:“Os centros comerciais que tem ali, de um lado e de outro, é só gente ruim. Estamos aqui perto do Intendente que tem uma fama que a gente sabe. O que segurava aqui o nosso negócio era aqui a Câmara, que era aqui em baixo e que foi embora há uns 6 ou 7 anos. E a clientela mudou muito. A nossa clientela… pronto, é má. É uma clientela má porque é gente de todos os níveis”; “A minha mulher, é difícil vir aqui. Vem uma vez ou duas por ano. Ela chega aqui e diz assim “Ó Zé, parece que estamos noutro país.” (comerciante autóctone).

As dificuldades de aceitação da alteridade no contexto da convivência quotidiana também se refletem nos planos olfativo e sonoro, evidenciando-se os temperos usados na gastronomia dos diferentes grupos imigrantes, assim como, a sonoridade associada às diferentes línguas faladas, situação muitas vezes percebida pelos autóctones como uma certa falta de respeito face aos vizinhos portugueses, ou até como uma atitude de resistência acionadas pelos imigrantes (mais atribuída aos chineses) (Gésero, 2011). Uma das técnicas que representa a Unidade de Projeto da Mouraria (UPM) salienta as barreiras à comunicação entre autóctones e imigrantes:

“Enquanto que os indianos, os paquistaneses e do Bangladesh falam inglês e minimamente uma pessoa consegue ir interagindo, os chineses não falam tanto assim e por isso é mais complicado…”(UPM).

Mas a incompreensão e até rejeição da “diferença cultural”, da alteridade e da diversidade de modos de estar indiciam tensões latentes e crescentes no quotidiano do bairro. Uma das técnicas que trabalha na UPM evidencia que:

“o bairro é habitado por muitas nacionalidades e raças e a comunidade branca também lá está. Há dois tipos de comunidade para mim, branca, ali dentro: há aqueles que ali nasceram e que vivem amargurados e em dificuldade com a invasão multicultural que o bairro tem e apresenta. No fundo têm a dificuldade em conviver o Ramadão. O bairro tem uma série de mesquitas e o Ramadão faz com que as pessoas durante a noite vão rezar e como só podem comer à noite, também fazem barulho porque fazem pequenas reuniões de alimentação para comerem depois de rezar. Isso provoca uma situação em que há muito barulho na rua e nos apartamentos. (…) Depois há famílias africanas que do 5º andar em vez de trazerem o saco do lixo para o lixo, atiram os sacos do caixote do lixo para o saguão ou para um espaço que eles consideram uma lixeira. As pessoas brancas têm as suas roupas lavadas, levam com o frango e com a muamba de galinha…

Muito embora os entrevistados de nacionalidade portuguesa revelem dificuldades em compreender e aceitar os imigrantes, há outros que fazem questão em manifestar a inexistência de “problemas” ou de relações conflituosas com os vizinhos de origem imigrante.

“Ao contrário do que se pretende tentar demonstrar, as pessoas do bairro e os imigrantes ‘estão de costas voltadas’, passo a explicar isto dizendo que não é que sejam hostis ou agressivos, “as pessoas podem eventualmente cumprimentar-se, mas não se relacionam, ou quando se relacionam, muitas vezes ouvem-se queixas, como por exemplo em relação aos bangladeshi que deitam o lixo de qualquer das maneiras e tardiamente. Que um vizinho está constantemente a cozinhar caril e é um cheiro imenso no prédio etc. “Cada um faz a sua vida e pronto, não há grande amizade” “. (Associação Renovar a Mouraria)

Mas são os autóctones (e mais velhos), os que na sua maioria se sentem mais orgulhosos do seu bairro (Fonseca, coord., 2010). As evidências empíricas derivadas de um inquérito realizado a 100 indivíduos de origem imigrante e a 100 nativos em 2009-2010 residentes na Mouraria e Martim Moniz apontam a existência de elevados níveis de interação nos espaços públicos (p.e., parques) e um número escasso de visitas ao domicílio independentemente da origem do inquirido (Idem). Embora, a população residente continue a ser maioritariamente portuguesa, os estrangeiros representavam em 2011, 28% dos residentes (nas duas principais freguesias: São Cristóvão e São Lourenço e Socorro), sendo de destacar a presença dos nacionais dos PALOP, da India, Paquistão e China (UP Mouraria, 2010).

O mapeamento dos espaços públicos no bairro, feito durante a pesquisa etnográfica, indica diferentes regimes de ocupação do espaço público e que não se intercetam, bem como a existência de uma sociabilidade segmentada, observando-se um uso mais ostensivo do espaço público por parte dos homens. A este respeito, já Menezes (2003: 212) tinha observado que os homens têm uma presença mais exposta do que as mulheres. A este respeito, relembre-se Bauman (2007: 60 e 133) ao afirmar que a vida urbana é movida por estranhos entre estranhos, existindo diferentes formas de coexistência, desde o existir-ao lado; o existir-com e o existir-para. Dos depoimentos dos entrevistados parece que na Mouraria o existir-ao lado é a modalidade mais recorrente, traduzindo-se em contactos fragmentados ou episódicos, envolvendo só uma pequena parte dos múltiplos desejos e interesses do indivíduo. Os vários grupos e universos sócio simbólicos coexistem e vivem lado a lado, sem se conhecerem, o que está bem patente neste testemunho:

“(…) a Mouraria é um bairro culturalmente diversificada, existem muitos grupos … As pessoas não se misturam muito, há desconfiança de uns face aos outros e não querem se misturar” (Joana, ex-residente)

No plano das relações comerciais e profissionais, os comerciantes portugueses sublinham a concorrência “desleal” perpetrada pelos comerciantes de origem imigrante, já que estes usufruem de benefícios fiscais, beneficiando de uma fiscalização mais permissiva aos seus estabelecimentos (perceção e sentimento de injustiça).

Independentemente das críticas que possam ser aduzidas de parte a parte, o comércio nesta zona de Lisboa atraiu novos consumidores, novos empresários, novos produtos, novos serviços e também novas experiências. Um dos comerciantes de origem estrangeira reafirma as oportunidades que aqui se encontram justapostas:

“Devido ao conhecimento dos restaurantes, gostam da comida. Agora a internet também ajuda bastante, porque tem receitas, conhecem mais os produtos. A comida indiana sempre foi mais gostosa do que a habitual. A gente tem aqui muita variedade também, dos produtos. (…) temos  clientes de quase toda a parte de Portugal; temos clientes de Leiria, Setúbal, Porto, até; também temos clientes de [Vila Nova da] Barquinha, do Alentejo também; mas mais clientes regulares são clientes de Lisboa, distrito de Lisboa.“(Comerciante nacional do Bangladesh)

 

4. De bairro segregado a espaço multicultural e cosmopolita

Importa relembrar que a Mouraria atraiu em diferentes temporalidades comerciantes de distintas origens étnico-nacionais. Desde indo-portugueses, hindus e muçulmanos, que começaram a instalar-se na zona em meados dos anos 70, dedicando-se principalmente ao comércio de brinquedos, bijutarias, quinquilharias, mobiliário e à importação-exportação (Malheiros 1996; Mapril, 2010), nos anos 90 assistiu-se à instalação de guineenses, cabo-verdianos e, mais recentemente, de senegaleses e zairenses (com lojas nas áreas da cosmética, música, produtos alimentares e restauração), mas também de comerciantes chineses – principalmente prove­nientes da província de Zhejiang e após a década de 90 (Bastos 2004; Mapril, 2010). Foi também nesta altura que se registou a fixação dos comerciantes paquistaneses (restauração, bricabraque, audiovisual) e bangladechianos (pronto-a-vestir, restauração, supermercados, bricabraque) (Mapril, 2010: 249).

Um levantamento realizado entre 2000-2002 ao comércio de rua na área de Intervenção da Unidade de Projeto da Mouraria (UPM) confirma as tendências já alinhadas, observando-se que 56,9% do comércio era dinamizado por portugueses, 31,5% por indianos, 4,8% por comerciantes de origem africana, 3,6% por chineses e 2,4% por paquistaneses. O comércio que se desenvolvia no interior dos dois centros comerciais era dominado quase exclusivamente pelos chineses. (UP Mouraria, 2010: 20; Menezes, 2003). Estes tendem a dedicar-se a um comércio de caráter grossista, constituindo-se nos principais fornecedores de artigos para o comércio ambulante praticado pelos ciganos (em mercados e feiras. Enquanto lugar imbrincado pela alteridade, pela coexistência multiétnica[3], por novos consumos associados aos “comércios, serviços e produtos étnicos”, este bairro aparece ainda um lugar marcado pela insegurança associada à degradação do edificado e dos espaços públicos, à presença de sem-abrigo, da prostituição, de traficantes e usuários de drogas. Recorde-se que a Mouraria carrega um estereótipo sedimentado na história da cidade de Lisboa e de Portugal: o lugar para onde foram aos mouros que não saíram da cidade com a Reconquista Cristã (1170), marcando o início formal da Mouraria, mas também o início da ideia da área como um território estigmatizado porque o nome, representa o espaço físico para alojamento dos mouros, mas também significa, etimologicamente, o vale dos vencidos (Menezes, 2003).

No contexto do presente projeto, a maioria do comércio que decorre dentro dos centros comerciais é liderado por imigrantes, no entanto, estes negócios têm passado de mãos em mãos com uma certa regularidade significativamente. Enquanto no início a maioria dos locais pertencia a imigrantes de origem africana, no presente está em mãos de asiáticos, entre os quais chineses, e do sudeste asiático (Renovar a Mouraria, visita guiada 2014). Quanto ao comércio de rua, este, também, tem mudado de donos nos últimos anos, proliferando diferentes tipos de lojas e serviços de paquistaneses e bagladeshis, no entanto, o comércio vinculado a consumos alternativos e mais sofisticados normalmente é de pertença de portugueses.

Numa recente proposta de participação Câmara Municipal de Lisboa no projeto “Rede das Cidades Interculturais” a imagem da Mouraria diversa é reafirmada: “historicamente, um território composto por vulnerabilidades sociais, designadamente, grupos em risco ou em situação de pobreza ou exclusão social, baixos índices de qualidade de vida, alguma insegurança, e níveis de “guetização” territorial acima do comum e desejável, em Lisboa (…) Até final de 2013, a Mouraria será objeto de uma reabilitação urbana, o que constitui uma excelente oportunidade para se proceder a uma “revitalização social” em paralelo” (CML, 2011).

No Plano de Desenvolvimento Comunitário da Mouraria reforça-se que até 2013, a Mouraria será objeto de uma reabilitação urbana e social, procurando-se “atingir é a diminuição dos fenómenos de exclusão e pobreza, a melhoria da qualidade de vida, e uma maior abertura do território à cidade; a qualidade de vida e da coesão social.” (CML, 2011).

Já em 2001, Menezes (2003: 204) salienta que em 101 respondentes, 78,1% referiram que havia locais específicos no bairro marcados por problemas de segurança, havendo, no entanto, referências ao passado do bairro, como sendo mais seguro. Ainda hoje a insegurança continua a ser um elemento invariante no discurso produzido por técnicos, comerciantes e residentes entrevistados, geradora de tensões, mas também de estratégias de evitamento e de separação entre residentes e usuários deste território:

 “Há um problema complicado no bairro da Mouraria, que tem a ver com tráfico de drogas e há famílias ligadas ao comércio específico e comércio. Os traficantes de droga que não se misturam com os africanos, os castiços mesmo do fado. Também é um lado bastante obscuro, eles não se deixam “contaminar”, eles têm aquilo ali bastante balizado por causa da droga. Eles são difíceis. Eles são um outro tipo de brancos que não são os velhinhos, mas são aquela população castiça que eu acho que tem uma veia árabe muito forte ali metida que são as tabernas, as tascas, a droga, como meio de subsistência, negócio, as mulheres que vendem droga, as crianças que são correios de droga. Há ali muita coisa chata a acontecer e que eles preservam. Eles têm a polícia toda posta; a polícia deles, homens deles.” (Unidade de Projeto da Mouraria)

A insegurança civil (dos bens e das pessoas) não pode ser encarada de forma separada da insegurança social na medida em que esta envolve problemas como o desemprego, as desigualdades sociais e o racismo, o que tem incidência na primeira. A conjugação da precariedade do trabalho com a fragilidade dos suportes de proximidade gera o que Robert Castel (1998) designa como vulnerabilidade social. Este tipo de vulnerabilidades está ainda bem presente no quotidiano do bairro, apesar das mudanças em curso, como bem refere um dos representantes de uma das associações locais:

Portanto falta muito pouco tempo, mas há quatro anos atrás havia bastante consumo aqui na zona e tornava-se mesmo incomodativo porque houve casos de overdoses e falecimentos provocados pelas overdoses e nós vimos aqui muitas desgraças…a rua do Benformoso é uma rua onde tu já circulas com bastante á vontade execepto à noite. À noite não é seguro circular na rua do Benformoso mas de dia é seguro…” (Associação Renovar a Mouraria)

No presente, se bem que o tráfico de drogas é menos evidente que antigamente, não significa que tenha desaparecido, tendo-se deslocado para zonas liminares O consumo, no entanto, ainda tem alguma visibilidade em alguns becos mais dissimulados. Mesmo assim, entre vizinhos e traficantes/consumidores parece existir uma convivência relativamente pacífica, evitando-se que uns incomodem os outros, mantendo-se assim a polícia à distância (Visita guiada Renovar a Mouraria 2014).

Segundo um diagnóstico produzido pela Unidade de Projeto da Mouraria, o bairro apresenta um certo estado de desertificação (abandono prolongado dos alojamentos) e degradação do edificado, embora as condições de habitabilidade básica dos alojamentos tenham melhorado (aspeto visível entre os censos de 1991 e 2001). Em 2001 cerca de 34% do total de alojamentos familiares encontravam-se desocupados. A Mouraria continua a ser um bairro onde o regime de arrendamento é maioritário, embora tivesse crescido a proporção de proprietários, concentrando uma percentagem razoável de propriedade pública, nomeadamente municipal (UP Mouraria, 2010).

Mas a degradação do habitat popular, a sobrelotação, a linguagem arquitetónica e os projetos de intervenção sócio territorial não têm conseguido evitar a segregação deste território, desde os planos de renovação urbana de 1930/40, que implicaram uma “limpeza e embelezamento” do mal afamado bairro da Mouraria (Menezes, 2003), até aos anos 60 com o Plano de Modernização do Martim Moniz que acentuou a marginalização física e social e a desvalorização dos seus terrenos, com continuidade nos anos 80, com o Plano de Renovação Urbana do Martim Moniz (com a edificação dos dois shopping centers); sendo que só em 1985 se criou o Gabinete Local da Mouraria (mais tarde Unidade de Projeto do bairro da Mouraria) – com funções ao nível da reabilitação, revitalização sociocultural, recuperação do património económico, urbano e arquitetónico. Esta área transformou-se assim em “objeto de renovação urbana” (Costa, Ribeiro: 1989 in Menezes: 2009: 308).

Em 2009 surgiu o “Programa de Ação”[4] (no âmbito do Quadro de Referência Estratégica Nacional) e que tem como principal aposta a requalificação do espaço público e do ambiente urbano, o que exige uma intervenção no tecido social da área de intervenção (UPM, 2010).

O Programa de Ação da Mouraria, tem a designação “As Cidades dentro da Cidade”, prevendo essencialmente a realização de intervenções arquitetónicas e de requalificação do espaço público e ambiente urbano em colaboração com as associações locais, tendo como propósito “tornar esta área da cidade mais atrativa, não só para o comércio, serviços, jovens e famílias, mas mais, segura e sustentável para os residentes e turistas” (UPM, 2009: 23). Neste quadro de mudanças, o novo Gabinete do Presidente da Câmara de Lisboa está já instalado no Largo do Intendente, prevendo-se que o Alto-Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural também desloque as suas instalações para esta área. Pese embora o caráter pontual destas iniciativas, estas são percebidas como ações-chave para a mudança.

“O facto do Presidente da Câmara vir simbolicamente viver – viver não, ter o seu gabinete de trabalho ali no Largo no Intendente – também fez com que as coisas corressem um bocadinho mais em feição da Mouraria, o que é ótimo, ainda bem que ele teve essa decisão, e há aqui uma vontade política em intervir nesta zona; e o serviço do município que é responsável pela limpeza urbana está bastante preocupado e tem feito um esforço – e isso é claríssimo para mim! – de 2008 para hoje o grau de lixeira diminuiu consideravelmente e isso, francamente, acho que foi um esforço municipal, agora trata-se um bocadinho de educar as pessoas.” (UPM)

Da análise dos documentos que fazem parte desta proposta, fica claro que este programa pretende essencialmente intervir nos espaços públicos de modo a promover a segurança e a utilização dos espaços do bairro e da cidade, tentando resolver de forma indireta alguns dos problemas sociais que assumidos como problemas urbanos (Castells, 1973).

Na verdade, em 2012 realizaram-se já duas intervenções estruturantes, uma é o projeto de revitalização da praça do Martim Moniz (à entrada da bairro da Mouraria) com a criação de quiosques, esplanadas e o Mercado de Fusão da autoria de um Ateliê privado – a CHP Arquitetos[5], tendo como objetivo central: transformar esta praça no “novo hot spot de Lisboa”.

A segunda, foi a requalificação da mal afamada praça do Intendente, antes dominada pela prostituição e o tráfico, com a criação de áreas pedonais, de novos espaços comerciais e de consumos culturais, p.e. o Café O das Joanas, o armazém da Fábrica de Cerâmica da Viúva Lamego que alberga a nova loja de A Vida Portuguesa, A Casa Independente (espaço que serve refeições, sendo também um espaço de exposições, de concertos, etc.) sem descurar a importância do turismo cultural, com a criação do Largo das Residências Artísticas (da Associação Sou), onde os clientes podem ser visitantes e participar nas atividades da associação. Na atualidade a Praça do Intendente tem uma nova áurea, tendo transitado de espaço estigmatizado e mal afamado para um hot spot noturno, contando com uma instalação de arte urbana – o “kit garden” – da artista portuguesa Joana Vasconcelos, mas também com bares e tascas que são cada vez mais procurados pelos diversity seekers.

Hoje em dia a Mouraria cosmopolita e multicultural, faz parte de vários roteiros turísticos e de consumos, reforçando o seu caracter de espaço de interseção entre o local e o global (atividades, consumos, consumidores), afigurando-se como um lugar atrativo tanto para estrangeiros e turistas, como para trabalhadores e residentes (Mendes, Padilla e Azevedo, 2014, no prelo).

 

Notas finais

Ultimamente este bairro tem vindo a experimentar a coexistência de “processos de transição sócio-urbanística, nomeadamente a fixação de imigrantes não europeus e a evidência de uma nobilitação urbana marginal, cuja ocorrência paralela tem conduzido à diversificação cultural e étnica” (Malheiros et al., 2012: 97). Concretamente, neste bairro lisboeta, os processos de transição e de transformação parecem resultar dos efeitos conjugados de fatores tão diversos como as políticas públicas desenhadas e implementadas neste local, a densidade e espessura de um tecido associativo e comunitário aqui existente, assim como da confluência de recursos políticos, económicos, sociais e culturais. Paulatinamente, de um imaginário dominante que tendia a conceber este bairro como um espaço mal afamado e segregado, ainda que contextualizado numa zona histórica de Lisboa, assiste-se à emergência de uma imagem que incorpora cada vez mais atributos que são percecionados de forma positiva e que qualificam este bairro como cosmopolita, multicultural, exótico e turístico (Mendes, Padilla e Azevedo, 2014, no prelo).

As transformações vividas na Mouraria nos últimos anos é consequência da conjugação dos projetos de renovação e reabilitação urbana e do investimento em programas sociais e culturais, o que tem fomentado o espírito de convivência cultural. Esta mudança é evidente nas novas modalidades de programas desenvolvidos pelas associações locais que incluem propositadamente os públicos imigrantes e diversos como alvo das intervenções. Quase todas as associações e organizações do bairro desenvolvem atividades com vários públicos, proclamando a diversidade, o que não acontecia anteriormente. Esta viragem é bem ilustrativa de dinâmicas de mudança em curso neste território. Por um lado os interesses e imaginários invocados pelas associações podem mudar conforme as novas realidades, atendendo aos recursos destinados a apoiar as ditas realidades (inclusão, coesão) e por outro, em consonância com as vontades políticas de efetivamente apoiar e liderar a mudança, como tem sido o caso da Mouraria.

Retomando, por último, um dos vetores axiais do nosso quadro teórico, é de notar que ao assumir claramente um tom crítico face ao conceito de multiculturalismo, o conceito de (super)diversidade mobilizado na presente pesquisa, apresenta propriedades heurísticas interessantes que convém destacar. Assim ao focalizar-se não nas identidades (que promovem a essencialização e reificação das diferenças), mas nas interações, nas relações de convivência e nas negociações quotidianas, permite conceptualizar de forma intersecionada aspetos como o género, a etnicidade, a classe social, as diferenças etárias e geracionais e outras divisões sociais; para além disso, ajusta-se bem a uma micro escala (a do bairro) captando a diversidade e a convivialidade num dado local sem esquecer as suas conexões com a escala nacional e transnacional (Berg & Sigona, 2013). Na verdade, a operacionalização da super diversidade e da convivialidade no bairro da Mouraria não deixou também de nos colocar alguns desafios de ordem metodológica. Neste contexto, a aposta passou pela mobilização de etnografias multisituadas e de estudos centrados sobre o bairro, assim a realização de micro análises, tornou possível a apreensão de padrões de interações, novas fronteiras e espaços de contacto, sem esquecer as hierarquias e as relações de poder que continuam a marcar as interações de alteridade, mas permitem simultaneamente captar a auto representação e a perceção dos outros, o que significa um avanço significativo, como já foi salientado face aos tradicionais conceitos de etnicidade e identidades, que se prefiguram como estanques e essencializadores.

 

Bibliografia

BASTOS, Cristiana (2004), “Lisboa, século XXI: uma pós-metrópole nos trânsitos mundiais”, in PAIS, José Machado;

BLASS Leila (orgs.), Tribos Urbanas: Produção Artística e Identidades, Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, pp. 195-224.

BAUMAN,Zygmunt (2006), Confiança e Medo na Cidade, Lisboa: Relógio d’Água.

BAUMAN,Zygmunt (2007), A vida fragmentada. Ensaios sobre a moral pós-moderna, Lisboa: Relógio d’Água.

BERG, Mette Louise & SIGONA, Nando (2013), “Ethnography, diversity and urban space, Identities”, in Global Studies in Culture and Power, 20: 4, pp. 347-360, DOI: 10.1080/1070289X.2013.822382.

BRITO, J. Pais de (1999), “O fado: etnografia na cidade”, em VELHO G. (org.), Antropologia Urbana, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, pp. 24- 42.

CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA (2011), Participação no projeto “Rede das Cidades Interculturais”, Proposta nº 237 / 2011.

CARVALHO, Francisco Avelino (2006), “O lugar dos negros na imagem de Lisboa”,in Sociologia Problemas e Práticas, n.º 52, pp. 87-108

CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA (2011), Plano de Desenvolvimento comunitário da Mouraria- relatório final, Documento para debate.

CASTEL, R (1998), As metamorfoses da questão social. Uma crônica do salário. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes.

CASTELLS, Manuel (1983), A Questão Urbana, Rio de Janeiro: Paz e Terra..

CLAVEL, Maitë (2004), Sociologie de l’urbain, Paris: Anthropos.

COSTA, Francisco Lima (2004), “Turismo Étnico, Cidades e Identidades: Espaços multiculturais na Cidade de Lisboa”, in APS, VIII Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, Coimbra: Centro de Estudos Sociais, Faculdade de Economia, Universidade de Coimbra.

COSTA, Francisco Lima (2011), “Globalização, diversidade e ´novas` classes criativas: a emergência de um sistema de produção etnocultural em Lisboa”, in Sociologia Problemas e Práticas, 67, pp. 85-106.

COSTA, António Firmino da; CORDEIRO, Graça Índias (1999), “Bairros: contexto e interseção”, in VELHO, G. (org.), Antropologia Urbana, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, pp. 58-79.

FLORIDA, Richard L. (2002), The rise of the creative class: and how it’s transforming work, leisure, community and everyday life, New York: NY, Basic Books.

FLORIDA, Richard L. (2004), Cities and the creative class, London: Routledge.

GÉSERO, Maria Paula (2011), Configuração da Paisagem Urbana pelos grupos Imigrantes. O Martim Moniz na Migrantscape de Lisboa, Dissertação de Mestrado Integrado em Arquitetura, Lisboa: FAUTL.

GILROY, Paul(2004), After empire: melancholia or convivial culture?, London, New York: Routledge.

LEFEBVRE, Henri (1971), De lo rural a lo urbano, Barcelona: Ediciones Península.

LEFEBVRE, Henri (1974), La production de l’espace, Paris: Ed anthropos.

LEFEBVRE, Henri (1991), O direito à cidade, São Paulo : Ed. Moraes..

MALHEIROS, Jorge Macaísta (1996), Imigrantes na Região de Lisboa: Os Anos da Mudança. Lisboa: Edições Colibri.

MALHEIROS, Jorge Macaísta et al. (2012), “Etnicização residencial e nobilitação urbana marginal: processo de ajustamento ou prática emancipatória num bairro do centro histórico de Lisboa?” In Mendes, Manuela (coord.), Revista Sociologiada FLUP, Sociologia número temático Imigração, Diversidade e Convivência Cultural,pp. 93-124.

MAPRIL, José (2010), ”Banglapara: imigração, negócios e (in)formalidades em Lisboa”, in Etnográfica, 14 (2), p. 243-263.

FONSECA, Maria Lucinda (coord.) (2010), City survey report: Lisbon. Executive Summary, Lisboa: IGOT-UL.

MENDES, Maria MANUELA; PADILLA, Beatriz; AZEVEDO, Joana (2014, no prelo), “Mouraria: convivialidade, diversidade e vulnerabilidades num espaço em transição”, Revista Espaço e Geografia, Universidade de Brasília.

MENEZES, Marluci (2003), Mouraria: entre o mito da Severa e o Martim Moniz. Estudo antropológico sobre o campo de significações imaginárias de um bairro típico de Lisboa, Lisboa : LNEC.

MENEZES, Marluci (2009), “A praça do Martim Moniz: etnografando lógicas socioculturais de inscrição da praça no mapa social de Lisboa”, in Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 15, n. 32, pp. 301-328.

OLIVEIRA, Nuno e PADILLA, Beatriz (2012), “A diversidade como elemento de desenvolvimento/atração nas políticas urbanas: contrastes e semelhanças nos eventos de celebração intercultural. In In Mendes, Manuela (coord.), Revista Sociologia da FLUP, número temático Imigração, Diversidade e Convivência Cultural, pp.129-162

PADILLA, Beatriz e AZEVEDO, Joana (2012), “Territórios de diversidade e convivência cultural: considerações teóricas e empíricas”. In Mendes, Manuela (coord.), Revista Sociologia da FLUP, Sociologia número temático Imigração, Diversidade e Convivência Cultural, pp. 43-67.

Padilla, Beatriz et al. (2012), Convivial Cultures, superdiversity, Results Report Draft, Lisbon, CIES-IUL.

UP MOURARIA (2010), Documento de candidatura ao QREN Mouraria.

UPM, Unidade De Projeto da Mouraria (2009),Programa de Ação da Mouraria: As Cidades dentro da Cidade. Unidade de Projeto da Mouraria, Lisboa, Câmara Municipal de Lisboa.

VERTOVEC S; WESSENDORF, S. (2004), Migration and Cultural, Religious and Linguistic Diversity in Europe: An overview of issues and trends,  Oxford, Centre on Migration, Policy and Society [COMPAS], University of Oxford, International Migration, Integration and Social Cohesion (IMISCOE).

VERTOVEC, Steven (2007a), “Introduction: New directions in the anthropology of migration and Multiculturalism”, in Ethnic and Racial Studies, 30: 6, pp. 961- 978.

VERTOVEC, Steven (2007b), “Superdiversity and its implications”, in Ethnic and Racial Studies, 30: 6, pp. 1024-1054

ZUKIN, Saron (1995), The cultures of cities, Malden USA e Oxford UK: Blackwell Publishers Inc.

 



[1] Projeto de investigação intitulado Culturas de Convivência e Super diversidade, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) [PTDC/CS-SOC/101693/2008], coord, Beatriz Padilla. Instituições envolvidas: Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES-IUL), Instituto de Investigação Científica e Tropical (IICT/MCTES) e Laboratorio de Estudios Interculturales, Departamento de Antropología Social de la Universidad de Granada (LDEI).

[2] Este texto focaliza-se apenas na pesquisa realizada na Mouraria/Lisboa. No entanto, o estudo foi desenvolvido por duas equipas de investigação, uma em Lisboa e outra em Granada, entre 2009 e 2012. A abordagem metodológica adotada implicou a realização de etnografias multisituadas em contextos caracterizados por culturas de convivência e super diversidade. A análise foi, assim, desenvolvida em duas cidades/áreas metropolitanas em dois países distintos – Lisboa em Portugal e Granada em Espanha; mais concretamente em dois bairros/unidades territoriais distintas em cada país: Mouraria e Cacém na Área Metropolitana de Lisboa; Realejo e Zaidín em Granada (centro vs. periferia). Em cada bairro/zona de análise realizaram-se 3 etnografias que se centraram em torno de três eixos de pesquisa: i) o bairro e as interações entre vizinhos nos espaços públicos; ii) os jovens/educação e os modos como a diversidade é ensinada, aprendida e experienciada através das interações em instituições formais e informais (escola, associações, programas de apoio pós-escolar, rua); iii) os eventos interculturais como manifestações de práticas e políticas culturais ao nível local (Ver Padilla, Beatriz et al. (2012), Convivial Cultures, superdiversity, Results Report Draft, Lisbon, CIES-IUL).

[3] Lisboa fez a sua adesão à Rede das Cidades Interculturais em 2011. O programa “Rede das Cidades Interculturais” é um projeto conjunto do Conselho da Europa e da Comissão Europeia criado e executado dentro do contexto do Ano Europeu do Diálogo Intercultural, cujo objetivo é estimular novas ideias e práticas em relação à integração dos imigrantes e das minorias. Esta Rede de Cidades Interculturais visa facilitar a orientação mútua e o intercâmbio entre as cidades, sendo as respetivas atividades concebidas de modo a envolver um amplo leque de atores – funcionários municipais, administradores, prestadores de serviços, profissionais e organizações da sociedade civil – no processo de construção de uma visão intercultural e estratégica para os municípios. A Rede de Cidades Interculturais pretende ainda reforçar as ações das comunidades locais, tirando o máximo partido da sua diversidade cultural, apoiar as cidades no desenvolvimento de estratégias de atuação e ações que ajudem a gerir a diversidade de forma construtiva e inovadora propondo políticas concretas e métodos que as cidades de toda a Europa possam vir a adotar e a beneficiar (CML, 2011).

[4] Este Programa de Ação da Mouraria responde, assim, quer à proposta de valorização da diversidade dos territórios definida no PNPOT(Plano Nacional de Planeamento e Ordenamento do Território para reforço do modelo territorial, quer mais concretamente a um dos objetivos políticos do Plano Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa (PROTAML): a promoção da qualificação urbana, nomeadamente das áreas urbanas degradadas ou socialmente deprimidas, bem como das áreas periféricas ou suburbanas e dos centros históricos. No que se refere à intervenção neste bairro histórico, a opção foi pela reabilitação dos edifícios; pelo tratamento cuidado dos espaços públicos; e pela promoção da participação cívica – reforço de coletividades e associações culturais.

[5] Este projeto assenta sobre estruturas já preexistentes, transformando-as e complementando-as com novas funções, criação de novas áreas de sombreamento e a praça passa a estar dividida em 3 zonas: 1) dois quiosques com esplanadas próprias (a norte); 2) no centro surge uma área de restauração com gastronomia de vários cantos do mundo com 8 quiosques, zonas de sombreamento e instalações sanitárias; 3) zona de mercado com produtos diversos que completa a praça com 36 stands para venda de artigos (mercado desmontável).

 

Nota curricular

Maria Manuela Mendes é licenciada e mestre em Sociologia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP) e doutora em Ciências Sociais pelo  Instituto de Ciências sociais da Universidade de Lisboa (ICS-UL). É Professora Auxiliar na Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa (FAUL) e investigadora no Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do Instituto Universitário de Lisboa (CIES – IUL).É ainda investigadora associada no Instituto de Sociologia da Faculdade de Letras do Porto (IS-FLUP) e no Centro de Investigação em Arquitectura, Urbanismo e Design (CIAUD, FAUL).

 

Beatriz Padilla é Professora Associada na Universidade do Minho, Portugal, tem um doutoramento e mestrado em Sociologia pela Universidade de Illinois em Urbana-Champain, um mestrado em Políticas Públicas pela Universidade de Austin e é Licenciada em Ciências Políticas e Administraçõa Pública. Os principais interesses de investigação incluem as migrações, o género, as desigualdades e as políticas públicas.